terça-feira, 25 de março de 2014

MÁ GESTÃO E DISTORÇÕES AMEAÇAM IPE



ZERO HORA 25 de março de 2014 | N° 17743


ADRIANA IRION E JULIANO RODRIGUES

IPE. Um sistema de saúde ameaçado



Adevassa feita por auditores na rotina administrativo-financeira do Instituto de Previdência do Estado (IPE) reforçou suspeitas que há anos servem para inflamar debates políticos em torno do plano de saúde dos servidores públicos: a carteira, nos moldes de hoje, está esgotada e não tem capacidade de ampliação sem contrapartida em valores atualizados. O sistema está endividado e vem sendo mal gerido, segundo resultado de inspeção extraordinária realizada pelo Tribunal de Contas do Estado (TCE).

Enquanto deputados de oposição e do governo debatiam, desde 2011, a possibilidade de o plano de saúde do IPE ser ampliado para atender aos pais de servidores, auditores descortinaram um quadro de sangria que tem como principal consequência a incapacidade do sistema de se autossustentar. O relatório indica que a situação só será revertida a partir de reformas que garantam o aumento de receitas e a redução de despesas.

O cenário encontrado pela auditoria indica que, desde 2004, as despesas aumentaram 104%, enquanto as receitas, 40%. O estudo mostra que há negligência na cobrança de devedores – são R$ 3,4 bilhões a reaver, dos quais R$ 2,9 bilhões deveriam vir do caixa do Estado, que deixa de cumprir com suas contribuições. Déficits são consecutivos desde 2011, segundo o levantamento, e a previsão é de que se repita pelo próximos anos, gerando dívida acumulada entre R$ 3,1 bilhões e R$ 4,7 bilhões.

Quando a análise mergulha em rotinas básicas de controle, o cenário piora: há usuários mortos que seguem sendo atendidos, lançamento de consultas sem senhas, pacientes diferentes sendo atendidos pelo mesmo médico no mesmo dia e horário, mais de 39 mil segurados identificados com número de RG zerado e médicos com atendimentos excessivos, como um que teve 193 consultas em um período de 10 horas – entre 20h e 6h.

Ao entregar para a Assembleia Legislativa o resultado da inspeção, na semana passada, o TCE contribuiu para estancar o andamento de dois projetos que previam a ampliação de segurados no IPE-Saúde. Um deles, de autoria do deputado estadual Paulo Odone (PPS), já estava em condições de ser votado. O parlamentar vai propor hoje, na reunião de líderes na Assembleia, que a proposta seja suspensa até que as condições do sistema possam ser discutidas em busca de soluções saneadoras. O outro projeto, de autoria do governo e que prevê a inclusão de pai e mãe como dependentes, mediante pagamento de contribuição com base em cálculos atuariais, será retirado da Assembleia hoje.

Criado por lei complementar em 2004, o IPE-Saúde começou a funcionar atendendo 866 mil beneficiários (hoje, são mais de 1 milhão), sustentado pelo Fundo de Assistência à Saúde, que recebe recursos do governo. A lei prevê uma série de medidas para tornar o instituto sustentável, como a realização de estudos técnicos atuariais periódicos e a revisão anual dos custos do plano. O relatório do TCE, porém, mostra que as sucessivas administrações do IPE não conseguiram mantê-lo sustentável, e o resultado é um plano de saúde que caminha para a falência.


Presidente contesta dados do TCE


A direção do Ipe-Saúde tem 30 dias para responder sobre os pontos elencados pela inspeção do Tribunal de Contas do Estado (TCE), mas o diretor-presidente do instituto, Valter Morigi, defendeu ontem que os segurados “podem ficar tranquilos” com o funcionamento do plano. Morigi lembrou que o descompasso nas finanças do IPE-Saúde tem origem na diminuição da receita e no aumento da despesa:

– A alíquota de contribuição dos servidores era de 3,6% e, na separação (em 2004), foi reduzida para 3,1%, sem nenhum cálculo atuarial. As despesas aumentaram com a maior procura por atendimento e com a possibilidade de inclusão de novos dependentes.

Morigi contestou a informação do TCE de que o Fundo de Assistência à Saúde – responsável por custear o plano – teria apenas R$ 50 milhões em caixa.

– O fundo hoje tem R$ 210 milhões e não os R$ 50 milhões mencionados no relatório – disse.

Sobre os problemas no sistema informatizado, nos cadastros de pacientes e a respeito de possíveis fraudes – como o caso dos servidores que tiveram consultas registradas após a morte –, o diretor do IPE-Saúde garante que o instituto vai investigar todos os episódios.

– O relatório do Tribunal de Contas será muito útil para que façamos melhorias – afirmou.


PÁGINA 10 | ROSANE DE OLIVEIRA

Futuro do IPE-Saúde é tema para candidatos ao Piratini


Com o congelamento do projeto do deputado Paulo Odone (PPS) e a retirada da proposta do governo que tramita na Assembleia, o debate sobre o futuro do IPE-Saúde será tema obrigatório na campanha eleitoral. O diagnóstico feito pelo Tribunal de Contas do Estado servirá como ponto de partida para a aprovação de medidas que garantam a sobrevivência do plano de saúde, mas é improvável que alguma mudança seja aprovada neste ano eleitoral. Diante da situação crítica do instituto, não há espaço para a demagogia.

A direção do IPE ainda tem três semanas para responder aos apontamentos feitos na inspeção especial que detectou os problemas apresentados por Odone ontem como justificativa para a desistência do projeto, que permitia aos servidores públicos incluir pai e mãe como dependentes no plano de saúde. O presidente Valter Morigi tranquiliza os servidores, dizendo que o IPE-Saúde não está ameaçado de quebrar, mas adverte que é impensável incluir novos dependentes sem a cobrança de contribuição baseada em cálculos atuariais.

Morigi não vê espaço para aumentar a contribuição de 3,1% dos segurados, com contrapartida idêntica do Tesouro, mas os candidatos terão de apresentar propostas para reduzir a despesa e aumentar a receita. A direção atual já comunicou às prefeituras conveniadas que terão de aumentar o valor pago e estuda a possibilidade de propor a elevação das contribuições de segurados incluídos no Plano de Assistência Complementar (PAC), como ex-ocupantes de cargos em comissão e filhos de servidores que deixam de ser dependentes legais aos 23 anos.

Distorções não faltam

Se uma pessoa que ganha R$ 25 mil for casada com alguém com salário de R$ 1 mil, pode deixar de contribuir para o IPE-Saúde e usufruir de todos os benefícios como dependente do cônjuge que paga R$ 31 por mês ao IPE-Saúde.

Outra medida apontada como urgente é impedir que os servidores que deixam de contribuir para o plano retornem sem cumprir um período de carência para a utilização dos serviços. Hoje, os jovens podem optar por um plano privado no início da carreira e retornar ao IPE quando adoecem ou ficam velhos.





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